Os presidentes do COFEN, da ABEn Nacional e ABEn-SP falam sobre a Enfermagem

GRAU e Corpo de Bombeiros estiveram em Santa Catarina. A ABEn (Associação Brasileira de Enfermagem) e o COFEN (Conselho Federal de Enfermagem), durante anos abordaram dialogaram com a Enfermagem de modos diferentes. Apenas recentemente encontraram um discurso comum, de equilíbrio e colaboração, visando a finalidade que é a mesma para ambas – o crescimento, desenvolvimento e reconhecimento da profissão. A seguir, uma entrevista com o presidente do COFEN, Manoel Carlos Néri da Silva, a presidente da ABEn Nacional, Maria goretti David Lopes e a presidente da ABEn-SP, Sarah Munhoz, expressando suas visões sobre a necessidade de envolvimento político da Enfermagem para a obtenção de conquistas para a categoria, além de outros temas do universo profissional. Cláudio Porto (COREN-SP), Manoel Carlos (COFEN) e Maria Goretti (ABEn Nacional)Manoel Carlos Néri, presidente do COFEN O que a Enfermagem precisa fazer para se colocar politicamente e conquistar vitórias para a profissão? Manoel Carlos – É preciso que o profissional de Enfermagem e a Enfermagem brasileira saia dessa posição cômoda de achar que através da técnica vai resolver todos os problemas relacionados a sua profissão. Durante muito tempo o ensino da Enfermagem no Brasil foi muito tecnicista. Dava-se o ensino técnico, mas não formava cidadãos. E isso ainda está muito presente na Enfermagem brasileira. Nós precisamos desenvolver a cidadania do profissional, para que a Enfermagem deixe de ser não-política. Vivemos em sociedade e nós, como profissionais, que vivemos numa corporação profissional, nós não podemos ser apolíticos. Vimos um bom exemplo de que devemos ser políticos no último dia 25 de março, em Brasília, durante a manifestação em favor das 30 horas de jornada para a categoria. Sentimos a importância de a Enfermagem construir representações no Parlamento Brasileiro. Hoje temos grandes projetos que mexem, inclusive, com a estrutura da Enfermagem e que estão em discussão no Congresso Nacional e nós não podemos ficar à margem, simplesmente, como espectadores desse processo. A Enfermagem tem que ser tecnicamente competente e politicamente competente também, para discutir as políticas de saúde, a política sindical, a política das suas associações de classe e discutir a política do país, porque está interligada a nossa profissão. Além de profissionais, somos cidadãos brasileiros, atuamos junto a nossa comunidade e em outros espaços, onde se discute e se faz política, nos estados, nas cidades e no Brasil. Acho que a Enfermagem tem que atuar também nesses espaços, para o desenvolvimento e o fortalecimento da nossa profissão. Maria Goretti – A Enfermagem quer se organizar e, cada vez mais, ocupar espaços onde tenha poder de decisão. Infelizmente, hoje, quando temos um candidato da Enfermagem ns eleições municipais, estaduais ou federais, a categoria de Enfermagem não vota neste candidato. Temos a maior força de trabalho na saúde no Brasil e que não se apresenta à vida pública tanto quanto desejamos. A ABEn Nacional, há 20 anos, sempre pauta em seus eventos as questões políticas envolvendo o Sistema Único de Saúde, as políticas públicas como um todo, com a questão do ser mulher na Enfermagem e de carregarmos todas essas características femininas. Termos que superar as questões sofridas pelas mulheres brasileiras dentro de uma categoria feminina e ultrapassar essas barreiras, formar consciências feministas, de homens e mulheres, para que tenhamos a mesma valorização dos homens na sociedade, mostra o tanto de trabalho que temos pela frente. Por que o profissional de Enfermagem não vota nos candidatos da categoria? Maria Goretti – A Enfermagem reproduz o modelo machista que temos na sociedade, e que remete sempre o poder ao médico. Dentro do posto de saúde, a Enfermagem “cuida da casa” e, quem manda, é o médico. Dentro dos serviços de saúde, como um todo, tem sido assim. E na política também. A Enfermagem não se filia a partidos políticos, que ainda são territórios de homens. A Enfermagem tem que ingressar em partidos políticos, escolher o que melhor lhe convém, independente de qual deles. Temos que entrar na política não para manter o que já existe, mas para mudar, fazer uma política de promoção da cidadania, buscando o avanço da sociedade brasileira. Maria Goretti David Lopes, Presidente da ABEn NacionalSarah Munhoz, Presidente da ABEN-SP O que o profissional de hoje já deixou de conquistar, por não se envolver politicamente? Manoel Carlos – Essa falta de mobilização da Enfermagem não é recente. Podemos remontar à própria história da Enfermagem, que teve, em seu início, forte influência da Igreja e de outros setores, e que nunca levaram a Enfermagem a ter um pensamento crítico. Em razão disso, é possível falar em que a Enfermagem deixou de avançar. Temos uma profissão que não tem uma jornada de trabalho regulamentada por Lei e cujo Projeto de Lei está tramitando há quase 10 anos. É uma categoria que não tem um piso salarial definido, ao contrário de outras categorias da área da saúde, e que é uma categoria que responde a 60% da força de trabalho na saúde. Acho que, apenas agora, a Enfermagem está começando a acordar para a necessidade de ocupar espaços, dentro e fora da profissão, e sinto que estamos chegando a um novo tempo, em que o profissional vai passar a se interessar mais e constatar que tem uma grande força latente, que vai ser despertada. E as conquistas virão. Maria Goretti – Vou dar dois exemplos de conquistas, que estão ainda em espera, por falta de envolvimento político e demonstração de força da categoria. Um dos exemplos é a atualização da Lei 7.498/86, do Exercício Profissional de Enfermagem, que tem pontos que necessitam de revisão urgente e sobre os quais nós, da ABEn Nacional, já iniciamos as discussões com o Conselho Federal de Enfermagem. Outro exemplo é a própria Lei de criação dos Conselhos de Enfermagem, a 5905/73, que nasce numa época ainda de ditadura no país e que não atende às expectativas dos profissionais. Agora, com a retomada do diálogo e do trabalho conjunto entre ABEn Nacional e COFEN, é possível incorporarmos ao Projeto de Lei sobre o assunto, que já está tramitando, aquilo que nós defendemos para o sistema, para que o sistema COFEN/CORENs seja amplamente capaz de corresponder a sua responsabilidade de fiscalizar o trabalho da Enfermagem no Brasil. Vamos abrir uma discussão ampla, envolvendo toda a categoria, para que possamos ter a melhor redação do texto destes dois Projetos de Lei e, assim, avançarmos na consolidação da Lei do Exercício Profissional e de um novo sistema COFEN/CORENs. Sarah Munhoz – Tenho acompanhado as questões da política em relação à situação da Enfermagem. Uma coisa muito interessante é que, quando um médico se candidata, ou é indicado a algum cargo político, ele permanece médio. Quando um enfermeiro é indicado para ocupar um cargo, ele se torna sanitarista, e esquece que é enfermeiro, como se o ser enfermeiro não fosse uma coisa boa. Entendo que temos que ter alguém que defenda os nossos pontos de vista, que diga quem nós somos, para que nós viemos. Esse posicionamento político nos leva a começar a cuidar de quem cuida, de uma forma melhor. Faço minhas as palavras da goretti e do Manoel Carlos. Se nós nos posicionarmos mais adequadamente, a Enfermagem só terá ganhos – e ganhos muito importantes para a profissão.