Esclarecimentos à Rede Globo sobre a atuação da Enfermagem na Atenção Básica
O Coren-SP vem por esta nota esclarecer a Rede Globo de Televisão sobre a real atuação da enfermagem nas Unidades Básicas de Saúde (UBS), após veiculação de reportagem no telejornal Bom Dia São Paulo do último dia 21 de maio, e que abordava as filas de espera em frente à UBS Jardim Ipê, em São Bernardo do Campo. Na ocasião, a repórter Mariana Aldano conduziu entrevistas com pacientes e realizou os comentários abaixo:
“O pessoal estava me contando aqui também, Rodrigo [Bocardi, apresentador], que para marcar consulta também não é muito fácil. Antes, eles têm que passar por uma enfermeira e aí a enfermeira decide se a pessoa vai passar pela consulta com o médico ou não”.
“E você estava me contando que a enfermeira já chegou a te receitar, a te fazer uma receita médica, é isso?”.
“A gente ouviu alguns casos, de pessoas que têm essa dificuldade, essa barreira do enfermeiro nesse processo até chegar ao médico”.
As manifestações contrariam a atuação da enfermagem prevista tanto na Lei do Exercício Profissional (Lei 7498/86) quanto na Política Nacional de Atenção Básica – PNAB (Portaria 2436/2017 do Ministério da Saúde).
No que tange à “decisão” da enfermeira, na verdade trata-se da classificação de risco, que consiste, de acordo com o previsto na PNAB, em “escuta qualificada e comprometida com a avaliação do potencial de risco, agravo à saúde e grau de sofrimento dos usuários, considerando dimensões de expressão (física, psíquica, social, etc) e gravidade, que possibilita priorizar os atendimentos a eventos agudos (condições agudas e agudizações de condições crônicas) conforme a necessidade, a partir de critérios clínicos e de vulnerabilidade disponíveis em diretrizes e protocolos assistenciais definidos no SUS”.
De acordo com o Art. 11 da Lei do Exercício Profissional da Enfermagem, cabe privativamente ao enfermeiro a “prescrição de medicamentos estabelecidos em programas de saúde pública e em rotina aprovada pela instituição de saúde”. Ou seja, dentro do âmbito das UBS, que prestam atendimento como parte da Estratégia Saúde da Família (ESF) — portanto, pertinente às definições da PNAB —, é pertinente a prescrição de medicamentos pelo profissional enfermeiro. Nota-se, neste caso, um equívoco do termo “receita médica”, relacionando a prescrição à atuação do profissional médico.
A Portaria 2436/2017 do Ministério da Saúde prevê como atribuição específica do enfermeiro nas equipes que atuam na Atenção Básica: “Realizar consulta de enfermagem, procedimentos, solicitar exames complementares, prescrever medicações conforme protocolos, diretrizes clínicas e terapêuticas, ou outras normativas técnicas estabelecidas pelo gestor federal, estadual, municipal ou do Distrito Federal, observadas as disposições legais da profissão” e “Realizar e/ou supervisionar acolhimento com escuta qualificada e classificação de risco, de acordo com protocolos estabelecidos”.
A atuação dos profissionais de enfermagem nessa etapa também é preconizada pela “Cartilha de Acolhimento com Avaliação e Classificação de Risco”, lançada em 2004 pela Política Nacional de Humanização (PNH), publicada pelo Ministério da Saúde.
Ou seja, a presença do profissional enfermeiro no acolhimento à população não se trata jamais de uma “barreira” ao atendimento médico, mas exatamente o contrário, pois significa um facilitador da assistência à saúde.
A enfermagem também é vítima da má gestão e do subfinanciamento da saúde pública, o que acarreta problemas diretos como violência no ambiente de trabalho e adoecimento mental decorrente da sobrecarga de trabalho, como já divulgado em pesquisas recentes realizadas pelo Coren-SP e amplamente divulgadas pela imprensa. Qualquer culpa impetrada à profissão pela demora no atendimento, com a qual a enfermagem também sofre, apenas contribui para uma perigosa desvalorização da profissão.
Desta forma, o Coren-SP pede à Rede Globo, pelo impacto junto a sua audiência, que verifique a legislação, os procedimentos e a realidade da enfermagem ao abordar os processos de trabalho na saúde e reforça estar à disposição para sempre dialogar sobre demandas que envolvam a profissão. A informação correta é importante canal de reconhecimento e luta pela melhoria das condições do atendimento tanto para a sociedade quanto para os profissionais da saúde.