Segurança do paciente na assistência de enfermagem psiquiátrica depende de reconhecimento

Falar em segurança do paciente em uma área ainda marginalizada como a enfermagem psiquiátrica é complexo. De acordo com a professora Dorisdaia Humerez, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), a reforma psiquiátrica melhorou as condições de trabalho e tratamento, mas ainda existe preconceito. “A enfermagem psiquiátrica é mal vista pela própria categoria, até porque nossa clientela é muito excluída”, diz.

A reforma psiquiátrica implicou em mudanças na atuação dos profissionais de Enfermagem. Se antes era basicamente restrita aos hospitais psiquiátricos, hoje até o enfermeiro do Programa Saúde da Família tem que atender no domicílio onde o paciente está, já que ele só será internado em caso de surto agudo. Do contrário, permanecerá na comunidade.

Por isso, segundo Dorisdaia, os enfermeiros que antes não cuidavam de pacientes com transtorno mental devem afastar o preconceito e entender seu papel social. “É uma visão mais ampla da saúde, não é só um tratamento de cura ou estabilização, mas fazer com que o paciente consiga viver em sociedade”, afirma a professora.

Práticas seguras

Uma das principais práticas seguras em saúde mental diz respeito ao tempo de internação. Quanto mais tempo o paciente ficar internado, maior é a chance de se envolver em um acidente ou erro de procedimento, e mais difícil será a reinserção social. Segundo Paula Martins, na psiquiatria o tempo de internação é triplicado em relação às demais especialidades. Se num hospital geral a média é de quatro dias, na saúde mental o tempo correto seria de duas a três semanas. Porém, fora de São Paulo e dos centros de excelência, ainda existem pacientes que ficam por dois ou três meses internados. Ou seja, mais insegurança.

Outro aspecto fundamental da segurança na saúde mental é o controle de medicamentos psicotrópicos, que envolve diversas regras. “A enfermagem psiquiátrica já controla e segue essas regras, mas não dá a elas o nome de práticas seguras, mas se refere ao controle estabelecido pela Anvisa”, diz Paula.

A quantidade de profissionais de enfermagem também é importante para garantir a segurança. Segundo Paula, não há dados sobre o número ideal de profissionais, mas ela estima que seria suficiente um técnico de enfermagem a cada três pacientes. Evidentemente, um paciente grave ou em surto agudo exige mais profissionais.

Em São Paulo, existem alguns privilégios de atenção à saúde mental, mas a realidade no restante do país está longe disso. “Considerando o Brasil inteiro, temos ainda descaso, abandono, maus tratos, nenhuma prática segura”, afirma Paula. De acordo com a enfermeira, é comum encontrar no estado um técnico para cada cinco pacientes, mas ainda existem instituições com um profissional para 40 pacientes.

Outro desafio da enfermagem psiquiátrica é a criação de indicadores de qualidade para medir a segurança. Isso porque, enquanto a enfermagem de modo geral tem indicadores objetivos, como a perda de cateter, na saúde mental o que conta é a medicação e o relacionamento com o paciente. “É preciso monitorar todas as atividades e se preocupar com o resgate da autonomia para que o paciente volte ao convívio social no menor tempo possível”, diz Paula.

Por exemplo, a contenção mecânica seria um indicador: quantos pacientes foi preciso conter, por quanto tempo, por que razões etc. A reinternação também seria um dos indicadores da qualidade da assistência. Se o paciente voltou a ser internado, em pior estado, o profissional deve investigar o que deixou de ser feito. “Será que o profissional não ofereceu estrutura psiquiátrica fora da internação, será que não orientou corretamente a medicação? Pode ser que o paciente abandone o tratamento, mas é sinal de que ele ainda não estava bom”, afirma Paula.