Mãos que tecem vida

Projeto desenvolvido pela enfermeira Adriana Moreira garante humanização e acolhimento especial a prematuros internados em UTI

O nascimento é um marco muito importante para a consolidação do vínculo entre a mamãe e o bebê. Embora esse elo se construa ao longo da gestação, é a partir do parto que a interação entre os dois se fortalece e o recém-nascido passa a ver na mãe uma extensão de si. Muitos fatores podem se tornar barreiras e dificultar essa interação, entre eles a prematuridade.

A internação em uma UTI neonatal restringe o contato direto com a mãe, impossibilitando o toque, a amamentação e oferece um ambiente pouco amigável ao bebê, devido a fatores como alta luminosidade, uso de aparelhos, entre outros. Na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital Geral de Pedreira, na capital paulista, esse cenário é bem diferente graças à atuação da enfermeira Adriana Maria Moreira, 46 anos, especialista em Neonatologia, Pediatria e Cuidados em Pré-Natal.

Além de trabalhar no hospital referência em gestação de alto risco, ela confecciona voluntariamente travesseiros ergonômicos que deixam o ninho neonatal ou o berço hospitalar mais familiar ao útero da mãe.

A ideia nasceu em 2010, após Adriana conhecer pela internet projeto similar de uma engenheira dos Estados Unidos, que produzia travesseiros com a aparência de uma luva. A inspiração foi o suficiente para a enfermeira inovar e transformar a vida dos recém-nascidos no hospital onde trabalha há 17 anos.

Mas foi somente em 2012 que obteve o consentimento do Serviço de Controle de Infecção Hospitalar para implantar a “Mão de Deus”, assim intitulado por muitas mãezinhas que vivem ou viveram a luta dos seus pequenos valentes pela vida.

O travesseiro é confeccionado com toalhas infantis, preenchidas com manta acrílica siliconada, doadas por voluntários, e têm uma anatomia que acolhe o bebê, fazendo com que ele se sinta envolvido, como no útero materno. Para tornar a experiência ainda mais real, há um mecanismo natural de aproximação entre mãe e filho, idealizado pela enfermagem. A equipe entrega o travesseiro à mãe e pede que o coloque no peito, embaixo da roupa. “Nesse momento, a mãozinha adquire seu anticorpo natural, além do cheiro. Essa familiaridade tranquiliza a criança, que normalmente fica agitada por se submeter aos cuidados da UTI”, explica Adriana.

As mãozinhas podem ser usadas de forma unitária ou em dupla, como “colchão” ou “travesseiro”, e também sobre a criança, exalando o cheiro materno. As peças são de uso exclusivo de cada prematuro, que quando recebe alta leva para a casa uma memória da sua valentia. “Quando vejo crianças apertando os dedos da mãozinha, descobrindo o espaço e algumas até segurando, percebo que o formato não poderia ser de um travesseiro convencional”.


Enfermeira Adriana Maria Moreira, especialista em Neonatologia, Pediatria e Cuidados em Pré-Natal confecciona travesseiros ergonômicos para recém-nascidos.

Outro método humanizado desenvolvido e confeccionado por Adriana são as redes em tecidos de flanela e com motivos infantis bem animados. Presas aos ninhos permitem que o bebê fique quentinho e na posição fetal. “Quando a criança encontra um ambiente mais próximo ao da mãe, com um cheirinho familiar, ela se acalma, vencendo o maior desafio de uma UTI”, celebra Adriana, que enobrece o vínculo criado entre equipe, mãe e filho, por meio de um olhar humanizado diante de quadros clínicos tão complicados.


Travesseiro ergonômico e redes em flanela reproduzem o ambiente acolhedor do útero materno.

Esse elo cresce e se fortalece junto com os bebês e continua presente na vida de muitos deles, como da pequena Luíza Valentina Guimarães, hoje forte e saudável, mas que por má formação passou por diversas cirurgias e fortes medicações. Para a surpresa da enfermeira Adriana, ela foi convidada para seu aniversário de dois anos. “É um vínculo muito forte. Quando eles têm alta levam a mãozinha e isso é um presente para a minha vida e a prova de que eles são vencedores”.