Profissionais da saúde em perigo: confira reportagem da Revista Proteção

Pesquisa aponta que 71,6% já sofreram agressão no ambiente de trabalho

A precariedade do atendimento à saúde no Brasil tem reflexo direto na violência sofrida pelos profissionais da área no exercício de suas funções. Uma pesquisa feita com enfermeiros, médicos e farmacêuticos no Estado de São Paulo mostrou que 71,6% desses trabalhadores já sofreram agressão física ou verbal no ambiente laboral. Para o estudo, encomendado pelos conselhos regionais das três categorias, foram entrevistados 6.832 profissionais (4.107 enfermeiros, 1.640 médicos e 1.085 farmacêuticos) em agosto deste ano.

Conforme constatado pelo levantamento, os principais agressores são os pró-prios pacientes, seguidos por familiares e acompanhantes. As filas e a demora no atendimento foram apontadas como as principais motivações, resultando em 66% dos casos de violência contra profissionais de enfermagem, 56% contra farmacêuticos e 53% contra médicos.

Entre os enfermeiros, 21,1% foram vítimas de agressão física e 90,9% de agressão verbal. O percentual de vítimas de agressão física foi de 18,3% entre os mé-dicos, e 47,2% responderam serem ví-timas de ofensas. No setor de farmácia, 7,2% já passaram por agressões físicas e 89,5%, por agressões verbais. As agressões a farmacêuticos são motivadas, sobretudo, pela negação do fornecimento de medicamentos sem receita médica. A ausência de remédios em farmácias do SUS (Sistema Único de Saúde) também é apontada como causa.

A rede pública é onde os profissionais estão mais vulneráveis. Entre os médicos, 75,6% das agressões ocorreram no SUS. Entre os enfermeiros, o percentual foi de 68,4% e, entre os farmacêuticos, de 37%. As profissionais mulheres estão mais sujeitas às agressões. Elas representaram

84% das vítimas em enfermagem, 57% em medicina e 77% em farmácia. Os mais jovens, com idade até 40 anos, também figuram entre as principais vítimas, por estarem, geralmente, na linha de frente do atendimento. Em enfermagem, eles respondem por 76% dos casos; em medicina, 63% e, em farmácia, 84%.

Apesar do alto índice de agressões sofridas pelos profissionais de saúde, a denúncia ainda é pouco registrada. Conforme a pesquisa, em média, 80% dos profissionais de enfermagem, médicos e farmacêuticos que passaram por uma situação de violência não efetivaram denúncia, principalmente, pela sensação de impunidade, pela falta de apoio da instituição, porque não sabia onde ou como fazer a denúncia e pelo receio de perder o emprego. Dos quase 20% que denunciaram, grande parte afirmou não ter recebido acolhimento. Apenas 15% dos profissionais de enfermagem e 11% de farmacêuticos se sentiram atendidos ao denunciar, diferentemente da categoria médica, que teve 59% das queixas acolhidas pela polícia, justiça ou pela instituição onde trabalha.

ADOECIMENTO

As agressões têm levado os profissionais de saúde ao medo e ao adoecimento ocupacional e, consequentemente, ao absenteísmo ou presenteísmo. “O levantamento demonstrou, mais uma vez, a falta de segurança dos profissionais de saúde em seus postos de trabalho. E isso se reflete diretamente na qualidade do atendimento à população, uma vez que as agressões causam atrasos, ausências e até mesmo a recusa dos profissionais para atenderem em condições adversas em localidades remotas”, afirma o presidente do Cremesp (Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo), o médico do Trabalho Mario Jorge Tsuchiya, também especialista em medicina legal e perícia médica.

“Sabemos que, para o paciente, o profissional representa, nos estabelecimentos de saúde, o próprio sistema. E se o paciente está insatisfeito com a demora no atendimento ou no agendamento de procedimentos e cirurgias, com a falta de medicamentos ou com a falta de leitos no SUS, o profissional se transforma em um alvo fácil”, comenta Tsuchiya. “Temos lutado incessantemente para sensibilizar as autoridades para a melhoria do atendimento no SUS, assim como para a melhoria das condições de trabalho para os profissionais da saúde”, complementa.

CAMPANHAS

Diante dos dados preocupantes, pelo terceiro ano, mas pela primeira vez com a participação do CRF-SP (Conselho Regional de Farmácia), o Cremesp e o Coren–SP (Conselho Regional de Enfermagem do Estado de São Paulo) fizeram, de 18 de setembro a 17 de outubro, a campanha ‘Violência não resolve – Quem cuida merece respeito’ em meios de comunicação e redes sociais com objetivo de conscientizar a sociedade em geral. “Realizamos a campanha para conscientizar a população de que violência não só não resolve como também prejudica o atendimento à saú-de. São dados alarmantes que, esperamos, possam ser minimizados com a conscientização de todos, incluindo o empenho do poder público em oferecer condições adequadas de trabalho e melhorias no atendimento à população”, ressalta Tsuchiya.

O incentivo às denúncias é outra forma de buscar o combate à violência. “Estamos em contínuo diálogo com as instituições, estimulando a denúncia por parte dos profissionais agredidos, para que tenhamos dados relevantes para cobrar medidas das autoridades”, afirma a presidente do Coren-SP, a enfermeira Renata Pietro. Segundo ela, nos últimos três anos, a entidade recebeu apenas cerca de 50 denúncias. Entretanto, só no universo da pesquisa, são quase 80% de mais de 4.000 profissionais que relataram agressão em seu ambiente de trabalho.

 

Fonte: Revista Proteção – edição 323 (novembro/2018)