Nota de repúdio à exclusão da enfermagem da política sobre drogas

O Coren-SP vem a público manifestar sua preocupação com os retrocessos previstos no Decreto nº 9.926/2019, do Governo Federal, que dispõe sobre o Conselho Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (Conad). A medida exclui representantes de organizações, instituições ou entidades nacionais da sociedade civil, dentre eles profissional enfermeiro – pela redação do Decreto nº 5.912/2006 – de comprovada experiência e atuação na área de drogas, indicado pelo Conselho Federal de Enfermagem (Cofen).

A enfermagem é imprescindível no trabalho de prevenção e tratamento dos usuários de drogas. Em consonância à Lei 13.840/2019, que institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas, a profissão está presente na avaliação prévia do paciente por equipe técnica, desenvolvendo ações, atuando em programas, projetos, atividades de atenção, no cuidado, na assistência, prevenção, reabilitação, tratamento, acolhimento, apoio, na mútua ajuda e reinserção social, além de realizar estudos, pesquisa, avaliação e planejar e participar das formações e das capacitações que objetivam que as pessoas se mantenham abstinentes em relação ao uso de drogas.

O trabalho em rede desenvolvido pela enfermagem se dá tanto nos diferentes níveis de atenção à saúde — ou seja, na atenção primária, internação, nos Centros de Atenção Psicossociais (serviços de saúde mental comunitários), nas comunidades terapêuticas, nos consultórios na rua e nos serviços de urgência e emergência, dentre outros. É uma profissão que estabelece um vínculo direto com as famílias, inserindo-se nas comunidades e realizando visitas domiciliares, estabelecendo ações intersetoriais, garantindo práticas que têm como premissa a parceria com a assistência social, a justiça, a segurança pública e o setor de educação.

Essa aproximação direta com pacientes, família e comunidade faz com que a enfermagem estabeleça relações de vínculo e corresponsabilização pelo cuidado, o que justifica sua participação no Conad, uma vez que este profissional que conhece o paciente e sua rede de apoio e que pode contribuir para o estabelecimento de políticas equânimes para a população.

Em meio a este processo, cabe ao enfermeiro o atendimento individual, através da consulta de enfermagem, como os realizados nos Centro de Apoio Psicossociais em Álcool e Drogas (CAPS-AD), bem como o acompanhamento terapêutico e a realização de visitas domiciliares em conjunto com outros profissionais. No campo específico da enfermagem, são realizadas avaliações de risco no primeiro atendimento do usuário nas unidades e em casos agudos de intoxicação e monitorados, conforme protocolos de cuidados relativos à síndrome de abstinência alcoólica. Também é oferecido o aprimoramento do autocuidado em ações simples e importantes como higiene pessoal, prevenção de doenças e tratamento de enfermidades muitas vezes negligenciadas em função do quadro de desamparo social.

O Decreto, assim como a reforma da previdência, a reformulação das políticas de saúde mental e a modernização das normas de saúde e segurança do trabalho, põe em risco a saúde da população brasileira. Excluindo a presença da sociedade e de especialistas em tema tão delicado e complexo, restringem-se as discussões e desconsideram-se as especificidades de cada profissão envolvida, sem qualquer participação democrática que contribua para as políticas públicas sobre drogas.

Ademais, a publicação do decreto corrobora com o processo de esvaziamento da atuação dos conselhos profissionais, como prevê a PEC 108/2019. A medida configura uma ameaça à garantia de uma assistência em saúde segura à sociedade, além de colocar em risco a autonomia profissional. Afinal, por quem poderia a enfermagem ser melhor regulamentada e fiscalizada do que senão por profissionais que conheçam as características e necessidades da profissão?

O Coren-SP, representando mais de meio milhão de profissionais de enfermagem, jamais se omitirá diante de mais uma ameaça à atuação da enfermagem em prol da saúde da população brasileira. Por isso, apela à Presidência da República que reveja a composição do Conad, com a inclusão dos membros da sociedade civil, entre eles um representante da enfermagem, de forma a ampliar e democratizar as discussões sobre a política de drogas.